Qual filósofo teria determinado que sentimentos são
entidades abstratas? Quais as premissas? A de que o que não se pode tocar ou
ver não seria concretude? E a música? Seria ela classificável no elenco das
abstrações? Ou seria a música uma concretude? Pra mim um arco que se atrita com
cordas produz concretude sonora. Por outro lado, um músico ou maestro que lê
uma partitura sem executá-la num instrumento musical, ouve essa música
mentalmente e só quando essa partitura é lida e executada, a música em sua faceta
mais, digamos, concreta vem à tona.
Partitura é o mar tranquilo e silencioso e música enquanto concretude
são ondas colidindo com rochedos.
Quem impôs a regra de que sentimento é abstrato? Amores e
ódios, euforias e tédios doem ou dão prazer, vertem lágrimas e precipitam
risadas. Isso pra mim é concretude, mesmo intangível e invisível.
Mas como artista e mais particularmente poeta, uso a palavra
e o verso pra traduzir tudo isso. E esses palavrersos vão sendo os mediadores
entre o sentido e os sentidos. O etéreo (ou nem tanto) sentimento virado no
cimento dos sons das palavras, significantes remetendo a significados. E tome
entrelaçamentos e intercorrências de palavras, invenções, pulsos como os de
corpos que vivem, manancial da emoção convertido em razão semântica e de volta
à emoção. Neologismo, invenções, jogos de armar e desmontar.
Poetas são prestidigitadores de signos e pontes entre o
humano e o sublime. Palavra lida, dita, cantada, gritada, sussurrada.
Poemúsica, poemusas, o inaudito ganhando a emoção do som, pavão que abre seu
diverso leque de versos, soco no estômago e encantamento, eternidade e momento,
sacro e profano, divino e humano.
A poesia sobrevive de nos fazer transversos, uns dos outros.
Adorei a prosa. Deliciosa combinação de palavras competentemente dispostas de forma a nos fazer viajar e pensar a respeito do sentimento em suas concretudes. E o singelo poema nos dizendo sobre a essência de um poeta. Parabéns!
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