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sábado, 15 de dezembro de 2018

rir de ti e de si



Ridículo é o que desperta o riso. Diz-se que o homem é o único animal que ri. Hienas não contam, porque aquilo só parece riso, sem ser, daí a expressão sorriso de hiena significar o que significa.

Embora seja uma das evidências da superioridade e supremacia da espécie, o riso humano é primitivo, atávico, visceral. Então o ridículo é um conceito intimamente ligado a esse primitivismo. Desperta o riso sarcástico. Tem um quê de cruel e perverso. É quase impossível não rir de alguém que cai de bunda no chão ou comete uma gafe em público, Vanusa em elevado estado etílico inventando partes da letra do Hino Nacional para uma plateia de autoridades, que se esforçam piedosamente para não explodir em riso coletivo na cara dela. Como evitar?

Crianças frequentemente são um tanto cruéis. Sempre que têm uma chance, sacaneiam o colega por pura diversão e o prazer de rir disso. É parte da natureza humana, da nossa espécie superior. Esse prazer se estende ao adulto. O humor, se não é jocoso, crítico, meio ácido, é grande candidato a despertar mais bocejos que riso. Quando os produtores do desenho do Tom & Jerry decidiram transformar a dupla em amiguinhos, a coisa perdeu totalmente a graça. Mesmo sabendo que sempre vai se dar mal, torço pro Frajola conseguir pegar aquele chato do Piu-Piu.

A poesia quase sempre é tratada com muita reverência, até mesmo pelos poetas e isso acaba lhe conferindo uma aura de seriedade e profundidade. Nada contra isso, mas um certo humor de quando em quando não deprecia a sua nobreza. Que o digam os repentistas nordestinos nas emboladas e no cordel.

E rir é um grande remédio, inclusive rir de nós mesmos. Automedicação, nesses casos, é recomendável. Graça que é de graça. Graça Divina deve ser Deus morrendo (hahaha!) de rir de nós, suas criaturas.









sábado, 8 de dezembro de 2018

Poesia não ensimesmada


Somos indivíduos e não podemos negar peremptoriamente essa nossa natureza em nome de idealizações sobre nossa elevação. Um dia seremos de novo todos um, mas isso demora e por enquanto somos não unos mas unidades. Temos um ego.


Mas não somos o umbigo do mundo, nem o sol com planetas e satélites girando em torno. É claro que o que sentimos, percebemos, pensamos e vivenciamos, passa necessariamente pelo crivo da nossa subjetividade, mas como poetas, nos cabe também exercitar o discurso na terceira pessoa, deslocar o foco da escrita para o outro, não só e sempre para o nosso eu.

Nessa nossa condição de indivíduos, a tentação de se expressar na primeira pessoa é permanente. É verdade que mesmo o discurso na terceira pessoa será sempre “contaminado” pela nossa cosmogonia, mas narrar uma história, criar um personagem, deslocar o foco para o(s) outro(s) pode ter o saudável resultado de textos onde nossa individualidade fica impressa de forma mais sutil, como, por exemplo, no nosso estilo.

Poemas na primeira pessoa estão presentes na obra dos grandes. Não há nada de errado nisso. Mas certamente, passam longe de se restringir a isso. Porque a vida, seus mistérios, agruras e maravilhas, e consequentemente os poemas, não se resumem ao Eu isso, eu aquilo, eu assim, eu assado...
Olhar para dentro, mas também para fora.






Janelas da alma

  

Por suas janelas desfilam mazelas

Piores seriam se não fossem elas
Viver no escuro, maior das sequelas
Não quer vidros negros nas suas janelas

Vigia do mundo, também te revela
Ligeira evasão, quem então era ela?
Cortina de pele, convém ter cautela
Se fecha e se abre, senha ou sentinela?

Mas quando o deus Sol, que as manhãs descongela
te vem possuir, derradeira donzela
é mais um mistério que enfim se revela

Um brilho te invade, uma cor de aquarela
e subitamente, por suas janelas
passa o que faz essa vida ser bela