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quinta-feira, 31 de julho de 2014

Sem contraindicações

Os franceses chamam o orgasmo de “petite mort”. Querem com isso expressar sua fugaz intensidade. Faço uma analogia com o riso. Também fugaz e intenso, além de prazeroso. Daí a expressão tão comum: morrer de rir. Rir tanto a ponto de desfalecer, cair no chão, perder as forças. Poucas coisas nessa vida são mais redentoras.

Expressão semelhante, mas não tão popular: ter um frouxo de riso. Muito eloquente ao fazer a leitura corporal das causas e efeitos de uma boa risada. A entrega mental e emocional que o corpo somatiza na gargalhada. Movimento, som, gesto, expressão.

O riso é a matéria-prima natural da diversão. A comédia existe há milênios pra isso. Um filme, uma piada, uma pessoa engraçada nos diverte e faz rir. O palhaço vive de arrancar risos das pessoas. Diversão é palavra com o mesmo radical de diverso, diversidade. Ou seja, as pluri riquezas da vida estão por toda a parte para nos encantar, comover, divertir.

Um querido amigo e colega de escola já mostrava precoce sagacidade ao nos aconselhar, diria mais até instruir sobre como evitar ser alvo do riso coletivo de escárnio ao se levar um tombo: ser o primeiro a rir! Rir de si próprio. Isso esvaziava o ridículo da cena, porque o prazer residia no mau humor da “vítima” do tombo e consequente chacota. Grande lição, com desdobramentos existenciais pra vida toda: não levarmos a vida e nem a nós mesmos tão a sério.

Um sorriso tem dois propósitos básicos: um, de expressar alegria, prazer, diversão, encantamento, é auto satisfação. O outro, de emanar empatia, aceitação, gentileza e satisfaz ao outro. Sorrisos francos, espontâneos, quebram gelos, resistências, pé atrás e mudam rumos de conversas e convivência.


Criança ri “à toa”. Criança ri de tudo. Talvez porque ela esteja sempre próxima do puro prazer, dos aspectos lúdicos da vida, e que a gente vai desaprendendo como efeito colateral da educação e do crescimento, que vão progressivamente nos tornando tão racionais, analíticos, pouco espontâneos, travados  e até medrosos. Por isso é que é tão bom quando adultos nos soltamos, brincamos, rimos, dançamos, abraçamos e ser criança de novo tenha efeitos tão terapêuticos na nossa saúde corporal e mental.


Rito


Nem sempre vem à boca o riso mais sagaz
Às vezes se dilui no sopro das narinas
Por outras se nota o brilho das retinas
Não raro as gargalhadas são viscerais

Existe o sério, estreita fenda pensativa
Estranho e intrigante como o da Gioconda
Também o que transforma múmia em coisa viva
Que surge sem motivo e se propaga em ondas

O riso é um incessante rito de passagem
Do medo mais adulto à infantil coragem
No rir pra não chorar que atenua a dor

O riso teima em vir em tempos de não rir
Resiste até no esgar do rosto de um faquir
No riso derradeiro de quem ri melhor


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