Diferentes
formas artísticas podem criar estruturas de expressão semelhantes.
O cinema ficcional segue uma estrutura narrativa básica que tem na
literatura o conto e o romance como seus afins. Personagens são
introduzidos, uma história é contada e se desenrola na direção de
um desfecho.
A poesia não comumente usa essa estrutura narrativa. Mas nada impede
que seja assim. Um poema pode contar uma história, ter uma
trama e um desfecho, que pode, inclusive, ser surpreendente. A
linguagem supressora da poesia, oposta à prolixidade da prosa
dificulta a narração, mas lidar com essas limitações formais e
conseguir contorná-las é prazeroso pra quem escreve. O Twitter nos
traz um exemplo expressivo disso com os chamados microcontos,
limitados aos escassos 144 caracteres dessa forma de comunicação.
Outro
exemplo é o haicai, com seu limite de três versos e dezessete
sílabas. Bem escrito, um micropoema assim pode contar uma história
com desfecho e tudo.
Sonetos
são formas poéticas limitadas a um total de quatorze versos, que se
compararmos com os tais microcontos de 144 caracteres ou os haikais,
de três versos, se apresenta até como um formato espaçoso para
acolher uma história a ser contada. E assim o fiz, ao narrar uma
história de amor de final inesperado:
A sós
A
boca escancarada de marfim
sorri
convidativa e provocante
Duas
mãos o acariciam dominantes
Romance
entre a centelha e o estopim
Seus
dois pequenos pés são pés de gueixa
que
deixam-se pisar sem relutância
Precisos
trampolins da ressonância
Revelam
seus segredos e ele deixa
O
som que se produz da transfusão:
madeira
no metal no corpo humano
da
essência da beleza é a tradução
Termina
o prelúdio, desce o pano
Depois
dos mil aplausos da emoção
enfim
a sós, as mãos e o seu piano
http://www.youtube.com/watch?v=X0jPVdpdk7w