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sábado, 21 de março de 2015

Cartas


Quase não se escreve mais cartas. Daquelas a caneta no papel. Das que levam selo no envelope.                                                                                     Um email ou mensagem de texto no celular podem até ter o mesmo teor essencial, mas uma carta é uma carta. A caixa de mensagens não virtual, aquela de madeira ou metal, com fechadura e que a gente abre não com o clique de um mouse, mas com a ponta dos dedos em busca de papéis palpáveis, guarda surpresas e expectativas. E não te inunda com spam e correntes e piadas.

Cartas são mais demoradas, já que manuscritas. E também demoram mais a chegar. Mas até essa aparente desvantagem pode se constituir numa vantagem; o suspense. E a ânsia da espera. Quando eu era bem jovem, minha namorada se mudou pra uma cidade bem distante e como não existia ainda a Internet, trocávamos longas e frequentes cartas de amor, intensas, nas quais até enviávamos pequenos objetos pessoais nossos, muito simbólicos do que queríamos expressar, inclusive presentificando nosso sentimento e presença ausente.

Me vem também a imagem romântica das mensagens em garrafas jogadas no mar. Isso me fascinava na adolescência e eu sonhava um dia me deparar com uma dessas numa praia. Soube que há pouco tempo uma foi encontrada, 40 anos depois de lançada e foi respondida!

Assim como o email é a carta virtual, navegar, hoje, não necessita de carta náutica, radar, ou pelo menos se guiar pela posição das estrelas. Basta um pc , note ou celular e um provedor de acesso. Mas como a amada das cartas estava em Brasília, eu navegava até ela a seco, sobre rodas, em estrada asfaltada.

Nada tenho contra a modernidade da cibernética e tampouco sou um saudosista que se refugia no passado. Falo apenas do humano e do que é atemporal e não se molda pelo tempo. E ilustro isso com Fernando Pessoa, um criador tão genial quanto febril de poemas e cartas. Ele escreveu um chamado Toda carta de amor é ridícula. Carta náutica foi meu poema inspirado nesse de Pessoa.


4 comentários:

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  2. Muito interessante e inteligente a sua página. Parabéns e sucesso sempre!

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  3. SILENCIAR É PRECISO

    Só exercem a arte de silenciar aqueles que possuem a sabedoria para compreender que as palavras nem sempre dizem tudo! (EG)

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  4. A TECNOLOGIA NÃO TEM ALMA
    Sempre que lembro do meu pai, o vejo deitado na cama, lendo um livro. Em casa, era assim que gostava de ler. Um leitor compulsivo e apaixonado. Não se tratava de hábito, muito menos obrigação. Era o seu maior prazer.

    Dar a ele um livro de presente era uma tarefa dificílima. Um dia teimei, entrei num sebo, separei uma dezena de bons livros e liguei para ele. - Pois então seo Pedro Ghislandi, vou lhe passando os títulos e os autores e o senhor escolha aqueles que desejar. Inútil tarefa. A todos ele já tinha lido. Alguns, inclusive, mais de uma vez. - Os livros mais cativantes, deve-se ler duas, três vezes. E garanto que a cada leitura farás novas descobertas, dizia do alto de sua vasta sabedoria.
    Conhecia a história da humanidade desde seus primórdios, discorria sobre qualquer assunto, filósofos citava às dezenas, escritores alemães, russos, franceses, tchecos, italianos, portugueses, ingleses, irlandeses, enfim. Um erudito na mais completa acepção da palavra.
    Assíduo frequentador da Biblioteca Pública Norberto Cândido Silveira Júnior, era comum vê-lo lá, de cócoras em algum corredor, folheando livros e mais livros. Essa posição corporal inusitada, de cócoras, naturalmente chamava a atenção de todos, inclusive dos funcionários da biblioteca, tornando-o até certo ponto uma figura folclórica, além de querido pelos que tiveram a oportunidade de ali conhecê-lo. Ficar de cócoras jogando conversa fora é, na verdade, um costume dos colonos de origem italiana. Na boca, além dos causos, um cigarrinho de palha também não podia faltar.

    Em certa ocasião, quis lhe dar um notebook. Assim, poderia ter milhares de livros virtuais à disposição. Claro que eu sabia que seria em vão. - Você acha meu filho, que eu poderia me adaptar a isto? Logo eu, que nem de bicicleta aprendi a andar! E era assim, caminhando pelas ruas de Itajaí é que ele arejava os pensamentos.

    Mas o notebook foi apenas para sentir a sua reação, sabia que jamais ele trocaria o papel pela plataforma virtual. - A tecnologia não tem alma, disse enfático para encerrar o assunto.
    E eu concordo com ele. Nada como o saboroso ritual de ter o livro nas mãos, folheá-lo, admirar a capa, a contracapa, analisar a apresentação do tema, o projeto gráfico. É uma magia que não pretendo descartar. É o mesmo que você assistir um filme na TV e no cinema. A emoção é outra.
    Mas há espaço para todos os suportes, sem que precisemos necessariamente abrir mão de um ou de outro. O mesmo vale para os jornais. O papel e a informação virtual podem conviver pacificamente, e assim penso que será ainda por um bom tempo. Infelizmente o professor Pedro partiu para sempre em outubro de 2013, mas deixou um grande exemplo a ser seguido pelos filhos e por seus inúmeros alunos, a paixão pela leitura e o amor incondicional à língua portuguesa. Ele não merece cair na vala comum do esquecimento!

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