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quarta-feira, 28 de março de 2012

Hai(tropi)cais

Existe uma já meio longa controvérsia a respeito dos haikais, ou haicais, ou ainda aicais. Como alguns sabem e outros não, haikais são poemas de 3 versos da tradição literária do Japão. Existem por lá há séculos e em geral aludem a algo observado pelo poeta na Natureza e têm um caráter metafísico e filosófico.


Eles só se tornaram mais conhecidos no Ocidente no século XX e era natural que à medida que fossem sendo assimilados, se ocidentalizassem e foi de fato o que ocorreu. Seria também razoável que para que tal assimilação de uma cultura por outra, a coisa não se descaracterizasse a ponto dos haikais no Ocidente se transformarem em algo completamente diferente do original. Então foram estabelecidos parâmetros: um haikai deve ter 17 sílabas, distribuídas em 5, 7 e 5, nos respectivos versos.

Penso de uma forma que tenta conciliar a tradição com a modernidade e essa minha concepção me leva a ser mais flexível. Por exemplo: já escrevi muitos sonetos de métrica irretocável, mas movido pelo espírito do experimentalismo, alguns desses sonetos eu quis construir com uma única rima, ou apenas duas, assim como também experimentar vários tamanhos de versos, que fugissem dos tradicionais decassílabos, que por sinal já escrevi muitos também.

Nesses e em outros casos eles não deveriam ser chamados de sonetos? Discordo e vou continuar chamando-os de sonetos. O mesmo ocorre com os haikais. Os menos radicais aceitam que se estendam até 19 sílabas, mas os puristas torcem o nariz não só pra isso mas pra tudo o que segundo eles, profane as tradições. Paulo Leminski e Millôr Fernandes, dois “haikaizeiros” de mão cheia cansaram de romper com esses limites formais e produziram inúmeros haikais brilhantes e certamente riram desses patrulhamentos. Escreveram haikais com variadas métricas e mandaram muitíssimo bem. Tenho-os como um modelo muito mais qualitativo que esses puristas. E cá entre nós, tem "haikai" que obedece na forma  a todos os pré-requisitos, mas que tem muito menos alma de haikai que muitos outros que de algum modo transgridem essas regras.

Volta e meia me deparo com haikais ocidentais que tentam ser como os japoneses. Comumente resultam em pastiches, cópias. Então questiono: somos japoneses? Moramos no japão? Escrevemos em japonês? Por isso, irreverentemente chamei uma vez meus haikais de hai(tropi)kais. Há quem prefira chamar os haikais que não obedecem aos rigores da forma de poetrix, mas isso no meu ponto de vista não passa de apenas mais um nome. Vou então chamar poemas de 8 versos de octoplex. Que diferença vai fazer?


Cabe aqui um paralelo: um compositor erudito contemporâneo nosso, se não criar peças imitando o barroquismo de Bach ou Vivaldi ou o romantismo de Chopin e Schumann, não poderia nem deveria, por isso, ser discriminado e ganhar a pecha que que seu trabalho não é música erudita.

Arnaldo Jabor hoje escreveu uma crônica oportuna no Globo. Fala sobre a excessiva importância dada à forma em detrimento do conteúdo. Poesia que só visa à forma é mero malabarismo. Gosto de experimentar com as formas, no entanto elas só se sustentam tendo como base o conteúdo. Pelo menos na Praia da Poesia, que é a minha.



                                                                                  

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