Nesses tempos
de tablets, smartphones e outros “gadgets”, ainda não me acostumei com
escrever, criar, nesses pequenos dispositivos. Já tem alguns anos que criei o
hábito de escrever direto no computador, mas a escrita à mão não abandonei
completamente; num caso isolado ou outro, ainda lanço mão (literalmente) da
caneta e papel, que foram meus instrumentos por longo tempo.
Mas o
problema é quando não estou em casa. Romancistas e contistas são escritores
eminentemente caseiros no ato de escrever. Eu diria essencialmente caseiros. A
escrita deles é extensiva e contínua, ao passo que os poetas são mais
fragmentários, mais econômicos e imagens, ideias, palavras vão surgindo meio
atrevidas e insolentes e sem escolher hora e lugar pra “atormentar” seu
atarantado porta-voz, que é o poeta. É meio como ser um repentista mais
vagaroso e que cria em silêncio.
Sendo assim,
o “assalto” ocorre numa fila de banco, no supermercado, correndo na beira da
praia, num trajeto de carro, enfim, em situações imprevistas em que nem sempre
é possível sacar o smartphone e digitar no bloco de notas.
Já me
aconteceu inúmeras vezes e penso que não vai parar: ter que apelar pra minha
memória. A minha sempre foi boa, mas a distração e o excesso de informação nos
afeta e faz parciais desmemoriados. Mas com a poesia ocorre um fenômeno: a
memória se mostra quase infalível.
Não sei quantas vezes que, sem caneta e
papel, sem celular, sem lenço nem documento, fiz estrofes inteiras, às vezes até
poemas inteiros ou quase, “de cabeça”. Eu mesmo fico incrédulo e atribuo isso
ao medo de perder a ideia, a palavra, o verso e esse medo me faz obstinado a
ponto de reter tudo e “salvar” os versos no HD de massa encefálica. A cada
trecho já “escrito” reviso, declamo mentalmente e só aí prossigo na criação.
Quando chego
em casa, aflito, corro pra máquina, olho pro teclado e despejo tudo na tela,
com grande alívio, nesse louco “delivery” de poemas de rua.
Não recomendo
esse hábito a ninguém, o risco da perda é alto. Só que acho mais perigoso ainda
cair num bueiro aberto enquanto estou correndo e ao mesmo tempo escrevendo um
poema no meu celular.
O poema a
seguir é um desses “poemas de rua” que escrevi sem escrever. Um poema “de mente”.
Adorei esta maneira de expressares teu poema de rua!!! Adorei
ResponderExcluirJorge me identifiquei muito com o seu discurso, comigo acontece da mesma forma tenho que correr escrever para não perder, infelizmente minha inspiração , a maioria delas, vem quando estou debaixo do chuveiro, ai elas escorrem pelo ralo, fica apenas a ideia inicial, muitas vezes são poemas inteiros...
ResponderExcluirHoje sei o que isso que explicou significa. Ontem na saída do trabalho e hoje pela manhã passei por semelhante situação e tive de vir mentalizando o poema até chegar a um local onde pudesse escrevê-lo. É um risco que corremos e também um ótimo exercício para nossa mente.
ResponderExcluirEu nunca me acostumei e nunca vou me acostumar... E vítima de muitos plágios que já fui fechei meus blogs e hoje posto mais poemas de outros poetas do que os meus...
ResponderExcluirHoje tudo mundo escreve, todo mundo é poeta de uma hora para outra, acho muito bom isso, mas que o poema de cada um venha da alma e não de dilacerações de escritas alheias... Olha desculpa o desabafo, mas com essa modernidade é o que está a acontecer.
Quanto a sua escrita ela é consciente, bem elaborada, gostei muito!!!
Nos vemos no face!
A descrição, simples e clara, nos coloca diante da beleza do ato de criar. Volta e meia me pego agradecendo ao universo pelos "atarantados", que transformam inquietude em poesia. Prosa e poema deliciosos.
ResponderExcluirAmei este poema de rua ou "de mente". Infelizmente, não posso contar com minha memória. Já perdi sonetos inteiros, e dos bons, por não salvar logo e depois não me lembrava de um verso sequer. A frustração me bloqueava totalmente. Quando vem uma inspiração, ou dou um jeito de anotar ou nem sigo, prefiro abandoná-la logo que me frustrar depois.
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