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sexta-feira, 3 de abril de 2015

Canções: maiores que a soma das partes




Desde a chamada tenra idade eu já me ligava nas palavras e instintivamente, ainda sem elaborar, me fascinava com suas múltiplas possibilidades semânticas e sonoras. Tanto que já arriscava meus primeiros trocadilhos, o que causava certa surpresa nos adultos mais habituados ao menino introspectivo.

O gosto foi aos poucos evoluindo para obsessão e o já adolescente era uma traça ainda em crescimento devorando desde bulas de remédio a romances de Emile Zola, passando por palavras cruzadas, gibis, jornais e dicionários.

Nesse cenário, a ponte para a escrita foi construída de forma lenta e sutil e à medida que tímidos e despretensiosos arremedos de poemas iam tomando forma, foram retroalimentando uma necessidade de me expressar pela palavra.

O gosto, igual em tamanho e intensidade, pela música, contribuiu para guindar o flerte com a escrita aos patamares mais altos do caso sério. Porque minha musicalidade natural não restringia meu foco a mensagem e conteúdo. Eu desejava também a forma, o significante no objeto sonoro palavra. E fui deixando de me contentar com apenas ler livros e ouvir discos. Queria também fazer, criar.

E foram nascendo as canções. Tenho um especial apreço por canções. Elas são a fusão de dois dos pilares da arte: música e literatura. 

A canção me fascina. Escrevo isso ao som de Mônica Salmaso interpretando canções de Guinga e Paulo César Pinheiro. Beleza beirando o sublime. A canção não é simplesmente uma letra musicada ou uma música letrada. Não é mera superposição de linguagens. Uma canção é a fusão de duas entidades que resulta numa terceira entidade. Daí sua singularidade enquanto arte.

Uma bela canção é como um amor correspondido, que é maior que a soma das partes. Letra e música se valorizam mutuamente. Notas musicais, fonemas, ritmos e rítmicas, melodias ascendentes que ressaltam exclamações e descendentes que evidenciam melancolias, acordes maiores, menores, perfeitos, dissonantes, tessituras semânticas, harmonia, os sons das palavras fundindo-se  com os sons musicais, enfim, boas e belas canções são propulsores universais da alma da gente. Não ficamos indiferentes a elas e parece que tampouco elas a nós.

Eu e meu parceiro Antonio Jardim temos mais de 40 canções feitas a partir de sonetos meus e que chamamos de Cançonetos. Na impossibilidade aqui de uma audição, transcrevo um desses sonetos que viraram canções.