Desde os caras pintadas, na Era Collor, a
juventude não se manifestava, pelo menos dessa forma coletiva e pujante de
agora. Poucas vezes se viu o slogan “o povo unido jamais será vencido” ser tão
efetivo. E gente de todas as gerações se comoveu de ver tanta e tão espontânea
mobilização.
Nisso tudo, o que mais me chamou atenção foi
constatar o sonho vindo à tona, o sonho encontrando instrumentos, ferramentas
pra se tornar realidade, transpor esse limiar do intangível e deixar essa
natureza abstrata dar lugar ao palpável. E isso veio na palavra, no gesto, nas
atitudes. Tem sido bonito ver tanta emoção e idealismo tomando forma e sendo
canalizado pra mudança.
O homem sempre, de algum modo, foi movido pelo
sonho e pelo desejo da mudança. E a História náo foi e é feita só de
empreitadas bem-sucedidas. A Aventura humana sempre foi marcada pela
montanha-russa de fracassos e sucessos, luminosidades e trevas, alegrias e
tragédias, nesse percurso em permanente construção. E mesmo os fracassos, os
retrocessos, ajudaram a pavimentar essa tortuosa estrada. Mais que o sucesso, a
vitória, os objetivos alcançados, importa o espírito, a vontade, o anseio de
liberdade e justiça e o arrojo e desprendimento de romper com padrões, quebrar
velhos paradigmas e no lugar deles criar novos, essa inquietação e
inconformismo tão próprios da juventude, essa força motriz e orgônica movendo a
vida e tudo o que dela deriva.
É um destemor que, se fosse muito consequente,
talvez não empreendesse mudanças dramáticas e profundas. Não foram os pilares
do senso comum que impulsionaram os grandes saltos. O componente de uma certa
inconsequência, de uma desmesura é que é marca recorrente.
Isso me remete à história de Ícaro, que no seu
ímpeto de voar e de escapar do labirinto que o tolhia, não deu ouvidos à
advertência de que a cera com que colou as asas ao corpo derreteria ao se
aproximar do sol e caiu e sucumbiu. Falhou, mas tentou.
Tomara que nossa juventude faça o sonho virar
realidade e com isso herde um país e um mundo melhor. Mas o mais relevante
nisso é o desejo. E junto com ele a coragem. Pra empreender as mudanças e pra
que isso seja possível, lutar como estão lutando.
Saga
Tão destemido, Ícaro decola
no rumo tão incerto quanto audaz
Não é o gesto heróico dos mortais
mas a ancestral vertigem que o assola
Frágil bem sabe a cera de suas asas
Que o inclemente sol vai derretê-la
Contudo alça o seu vôo até as estrelas
como se fosse o Cosmo sua casa
A queda é o previsível fim da saga
Mas a busca ultrapassa a própria meta
e vai além do oceano que o esmaga
No seu retorno o eólico poeta
mergulha em fogo e luz que se propaga
a clarear os céus de toda Creta
Tão belo texto, tão lindo momento.Parabéns pela síntese poeta.
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