Importante

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sábado, 29 de outubro de 2016

Metafísica nisso


Ao poeta ocorrem muitos temas, mas não necessariamente a maioria se transforma em poemas. Há mesmo poetas quase que monotemáticos, que perseguem recorrências sem pudor. Não me encaixo nesses extremos. 

Mas, quando em vez, questões metafísicas me assaltam. As clássicas perguntas sem resposta que talvez encontrem na prosa um terreno mais propício para suas especulações e indagações.

Ainda assim, o poeta aqui se permite cometer umas poesices sobre quem somos, de onde viemos, para onde vamos. A coisa cósmica me atrai e fascina. Adoro programas sobre o Universo, Astronomia. Deve ser bem coisa de poeta mesmo.

O que existia antes da Grande Explosão?  O Infinito não tem mesmo fim? E o Universo, onde começa e termina? Deus existe ou é só uma projeção da nossa imaginação? Somos literalmente filhos das estrelas, ou seja, feitos da mesma matéria que elas? Isso soa poético, embora seja Ciência.

Há quem simplesmente ignore essas questões, há quem se angustie e há quem, como eu, poeme sobre.

Uma das minhas perguntas sem resposta, se a vida e tudo à nossa volta é real ou apenas um sonho bem realista, uma alucinação permanente, encontrou acolhida numa teoria recente da Física Quântica: a Teoria de campo reticulado (teoria de física contrária à noção de tempo e espaço continuum da qual temos conhecimento) na qual tudo o que nossos sentidos e nossa consciência dão conta, pode não passar de projeção e o que os físicos chamam de o mais perfeito videogame já feito.


Daí verti isso num poema. Não precisamos ser solenes ao poemar sobre temas assim.


                                    
    

sexta-feira, 21 de outubro de 2016

Da gratuidade dos sonhares

Morfeu é o deus dos sonhos. Nós, suas presas, somos primeiro sedados por seu filho Hypnos, deus do sono. É quando Morfeu entra em cena pra nos induzir a sonhar. Os serenos são premiados com sonhos bons e aos intranquilos restam os pesadelos.


Sono e sonho são fisiológicos, pra que o cérebro se autolimpe. Inconscientes, dormindo, sonhamos. Parte minúscula dessa viagem suprarreal vem à consciência quando acordamos e quando isso acontece, o nosso dia amanhece regado a café e pão com recheio de resquícios de sonho. Será por isso que aquele pão doce com creme se chama sonho?

Mas o sonho ampliou sua área de significado, passou a ser também devaneio, sonho acordado, acalentado, secreto ou assumido, idealização, foco num futuro que pode ser breve mas tende a ser distante. E até mesmo quando um sonho não chega a se realizar, ele pode efetivamente nos constituir, como se evidencia em lutadores por várias causas sociais que não chegaram ao final dos seus objetivos, mas deixaram um legado para seus seguidores e foram fonte de inspiração de sonhos coletivos.

O homem que não sonha assim é asceta ou cínico. Não aspira, não rompe seus limites, não se transforma e tende a não acreditar, vai se encolhendo pra permitir que o desencanto ocupe espaços cada vez maiores em si.

Começamos a sonhar com o que desejamos, o que queremos vir a ser, a ter, a viver, experienciar, conhecer, desde crianças. Muitos sonhos que se realizaram mudaram o mundo, a Humanidade, os rumos da Civilização e crenças foram revistas. Visionários, como Einstein, são tidos como loucos até que seus sonhos se concretizem. Até os cães sonham.

Como John Lennon em Imagine, somos movidos por sonhos desde os mais grandiosos aos mais ínfimos e particulares. Acalentar sonhos agrega sentido ao viver. Ajuda a olhar pra frente, fazer, refazer, inventar, inovar...e até escrever  fantasia, delírio, sonho, premonição, versos e sobretudo, humanidade.




                                                                                 
 

sábado, 15 de outubro de 2016

Me per-mito

Um mito é uma narrativa sobre a origem de alguma coisa (origem dos astros, da Terra, dos homens, das plantas, dos animais, do fogo, da água, dos ventos, do bem e do mal, etc.”

Quem narra o mito? O poeta-rapsodo. Quem é ele? Por que tem autoridade? Acredita-se que o poeta é um escolhido dos deuses, que lhe mostram os acontecimentos passados e permitem que ele veja a origem de todos os seres e de todas as coisas para que possa transmiti-la aos ouvintes. Sua palavra - o mito - é sagrada porque vem de uma revelação divina. O mito é, pois, incontestável e inquestionável.”
                                                                                      Humberto Zanardo Petrelli


Poetas já não ostentam todo esse prestígio. Mesmo assim vocês ainda nos consentem sermos delirantes ou pelo menos lúdicos. Somos então mais mitômanos - nome chique pra mentirosos compulsivos – que mitologistas. No território livre da Poesia vale não só brincar, mas também experimentar, tentar dizer o indizível (só tentar já vale) e o inaudito, arremeter pequenas provocações com disfarces líricos em voos rasantes, veementes, doces, gaiatos, sensuais, graves.

Sendo assim, quis brincar de recontar um mito e o fiz livremente e em forma de letra de uma canção. Mitos sobre os elementos da Natureza e sobre o Cosmo sempre me fascinaram. Dentre eles o fogo, com sua aparência e consistência singular. Na verdade uma chama, uma pequena labareda qualquer, é uma miniatura de estrela, de um sol e é um deles que nos provê de vida. O fogo tem servido como fonte de ricas e perenes metáforas poéticas. Mas nesse caso o fogo não foi metáfora para o poeta, mas simbólico para os personagens do poema-letra.





Bravo guardião

Firme guardião da chama eterna                     
Vida toda a postos na caverna
para o fogo nunca se apagar
mesmo que atravesse todo o mar

Mas o inimigo quer roubar
a luz que derrota a escuridão
E ele enfrentará com as suas mãos
o que ousou o lume profanar

Numeroso o inimigo atroz
se faz ouvir o seu rumor
Mas o guardião no seu fervor
tem poder de um coração veloz
e lutou mostrando o seu valor
Pânico ao trovão da sua voz

Como um destemido semideus
o sagrado fogo protegeu
O seu povo teve gratidão
Dança, cantoria e comunhão

raiou o dia e o guardião
volta para a semiescuridão
Segue em sua missão de resguardar
a eterna chama a rebrilhar


sábado, 8 de outubro de 2016

Poyesis, ser ou não ser. Eis a questão?



Num país que ainda lê pouco
e onde o livro não é caro
e sim o salário é que não cabe no livro
pode parecer meio bizantino
debater os fazeres poéticos
e o tênue limite entre poesia e prosa
mas, enfim, sejamos renitentes e otimistas
até porque a Internet, mais e mais
tem se tornado
o território livre da poesia
de forma até avessa ao livro
que tem o crivo do editor


Comecei escrevendo esse post com frases, pontuação e parágrafos. Mas o tema me fez dispor o texto dessa forma vertical, típica da poesia, para alimentar o debate. É saudável a discussão, não necessariamente em busca de consensos, desde que não degenere em discriminação e patrulhamento.

Embora eu tenha brincado com livro / livre / crivo, o poema lá de cima na verdade é prosa.

No meu modo de ver não são métrica, rima, estrofes que determinam se estamos diante de prosa ou poesia e sim quando percebemos uma intenção poética no texto. Armando Nogueira escrevia crônicas futebolísticas eivadas de tiradas poéticas. Não chegavam a ser poemas, mas podemos chamá-las de prosa poética, que é um termo que tenta espelhar esse hibridismo característico da transição entre as duas linguagens. Guimarães Rosa escreveu romances num linguajar singular que o aproxima do poético, não há métrica, rima nem verticalidade visual, mas seus textos exalam poesia. 

Penso que mesmo os rigores da forma não existem para tolher a criação. Eles podem tornar prazeroso criar se atendo a cânones. De uma métrica precisa pode resultar uma rítmica envolvente, de uma rima pode emergir um conceito. Penso que no fundo é mais uma questão de habilidade, inspiração e senso poético, que resulta em boa ou má poesia e que ainda assim é visão subjetiva. Vejo poesia ruim rimada de forma forçada ou de forma sonora e criativa, assim como vejo poemas sem rima alguma que são brilhantes (Pablo Neruda fez cem belos sonetos de amor sem nenhuma) e outros tantos sem rima que são péssimos. 

Poesia de certa forma é dança e música e é dada ao poeta a escolha de tocar o piano poético, com rima, métrica ou sem elas, ou  carregá-lo penosamente nas costas, entediando e não mobilizando o leitor.

Mas discutir isso não cabe num post só.

Pra fechar, um soneto que fiz quebrando a regra das rimas, já que não as usei e ousei seguir o Neruda:

                                                       

Ungidos

Impulsionados da maneira certa
os bumerangues cumprem trajetórias
de ida e volta ao ponto de partida
com vento, chuva ou céu de brigadeiro 

Um dia um deles quase esbarra em outro
E logo ambos voam paralelos
Algo em comum além de bumerangues
os atraiu de modo irresistível

É que ao contrário dos da sua espécie
os dois são força a impulsionar a si
o que permite o voo de improviso

E ambos ungidos pelo raro encontro
se amalgamaram em nova e eterna rota
de nunca mais voltar ao mesmo ponto 


                                                                               
            Assistam o vídeo baseado no meu livro: http://www.youtube.com/watch?v=RwY7bTSfqpc

sábado, 1 de outubro de 2016

Antítese a favor



Escrevi um poema que propõe um jogo lúdico pela via de uma narrativa pseudo erótica, que joga com a aparente contradição entre erotismo e não carnalidade, ou seja, o intangível tratado como denso. Recorrer às antíteses é um recurso oportuno, que pode exercer variados papéis. Um deles é de desconcertar, coisa bastante saudável. Até porque entendo que na arte em geral e na poesia em particular (adoro dizer isso), não vejo sentido em apenas mais do mesmo, no previsível, dèjávu, no já dito e feito.
Desconcertar faz pensar, se questionar. Não é função única da poesia, mas tem sua relevância. Antíteses têm o dom de nos deslocar do nosso assento cômodo, colocando acentos onde eles convencionalmente não estão, como marcadores, pequenos choques no nosso embotamento, porquanto cotidiano, quase despercebido.
No caso do poema que se segue, as antíteses serviram ao propósito de criar um espaço, um âmbito de transcendência, uma mudança de patamar, num jogo entre o denso e o intangível, entre sensação (sentidos) e sentimento, apontando novos sentidos. O erotismo convencional, carnal, aparente na forma de um poema pseudo erótico.

                                                                  
Condensação

Muito me comove a libido
quando você, que me entende
atende os meus pedidos
e isso faz urgente
que o meu afeto
frequente o vão predileto
no fundo do teu carinho
bem apertadinho

E sem pedir licença
te cravo a minha presença
na tua febril saudade
de jamais ter saciedade
Tua aura sobe as paredes
quanto mais me bebe, mais sede
Geme a alma no estertor
O amor se adensa e faz amor

   
                     Assistam o vídeo baseado no meu livro: http://www.youtube.com/watch?v=RwY7bTSfqpc