Importante

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sábado, 29 de agosto de 2015

Poesia não ensimesmada


Somos indivíduos e não podemos negar peremptoriamente essa nossa natureza em nome de idealizações sobre nossa elevação. Um dia seremos de novo todos um, mas isso demora e por enquanto somos não unos mas unidades. Temos um ego.

Mas não somos o umbigo do mundo, nem o sol com planetas e satélites girando em torno. É claro que o que sentimos, percebemos, pensamos e vivenciamos, passa necessariamente pelo crivo da nossa subjetividade, mas como poetas, nos cabe também exercitar o discurso na terceira pessoa, deslocar o foco da escrita para o outro, não só e sempre para o nosso eu.

Nessa nossa condição de indivíduos, a tentação de se expressar na primeira pessoa é permanente. É verdade que mesmo o discurso na terceira pessoa será sempre “contaminado” pela nossa cosmogonia, mas narrar uma história, criar um personagem, deslocar o foco para o(s) outro(s) pode ter o saudável resultado de textos onde nossa individualidade fica impressa de forma mais sutil, como, por exemplo, no nosso estilo.

Poemas na primeira pessoa estão presentes na obra dos grandes. Não há nada de errado nisso. Mas certamente, passam longe de se restringir a isso. Porque a vida, seus mistérios, agruras e maravilhas, e consequentemente os poemas, não se resumem ao Eu isso, eu aquilo, eu assim, eu assado...

A palavra que define isso é ensimesmado: o indivíduo que pensa em si mesmo como que só no Universo, ou pelo menos o centro desse Universo.

Olhemos para dentro, mas também para fora.        


sábado, 22 de agosto de 2015

Quadrúmanos



Maria Regina Alves é uma figura. Não por isso, mas é poeta. Somos fãs confessos um da escrita do outro e amigos virtuais no Facebook. Nos conhecemos numa das comunidades de poesia em que postamos nossos textos.

Rapidamente nos tornamos interlocutores, com o estopim dessa afinidade da escrita. Um tempo depois, surgiu a proposta, nem me lembro se minha ou dela, de uma tentativa de poemar a quatro mãos.

E o poema saiu, ainda talvez com certo pudor da primeira vez. Não me recordo se o postamos ou engavetamos em nossos Words.

Entre muitos palpites um nos poemas do outro, muitas risadas com múltiplos assuntos não necessariamente só poéticos a esta altura, um belo dia – disso me lembro bem – ela me propôs nova parceria e dessa vez o par seria mais feliz. Ela queria arriscar um soneto.

E saiu o soneto quadrúmano! Detalhe interessante: poemas a 4 mãos são pouco comuns e sonetos em parceria, mais incomuns ainda.

Confesso que tem versos que sei que são meus e versos que são dela, mas alguns já nem sei mais de quem foram. Isso na verdade nem importa muito, o que conta é a organicidade do texto e ele a tem.

Temos estilos diferentes, personalidades diferentes e, claro, afinidades. É mais ou menos como num casamento, guardadas as devidas proporções. Diálogo, boa escuta, brigas, pazes, solidariedade, enfim, os elementos que toda boa parceria precisa ter.

Parcerias artísticas são muito frequentes quando são superposições de diferentes artes. Dois exemplos eloquentes disso são a música popular e o cinema, onde dois ou mais artistas co-laboram. Já no caso de uma só arte, como o da poesia, surge a dificuldade adicional de fundir ideias no mesmo campo estético.

Foi fascinante esse processo de construção e espero que outras parcerias nossas surjam. O produto final ficou uma terceira coisa, resultado desse amalgamar de ideias, palavras e visões.

Maria Regina disse sobre isso:

“Imagino que aquela história de que para fazer um poema, escrever qualquer coisa, é necessário o isolamento absoluto, o silêncio sepulcral, o distanciamento do mundo palpável é um pouco de exagero. Pois nada mais instigante e criativo que construir, que tecer idéias a dois. É constante ida e vinda, mudanças de direção e reencontros. Um exercício de ver-se no outro e através dele. Assim têm sido nossos encontros: trocas de tolerância, descobertas e a produção de um novo entre nós.”


Evoé, parceira!




sábado, 15 de agosto de 2015

Decolar


                                              
é bom ter um lar pra voltar é bom ter um mar navegar é bom ter o ar inspirar é bom ter o amar poetar...

Lar


É bom de ver
o amor crescer
e aos poucos ir tomando forma
E se preciso for
subverter a norma
que tolha o seu vigor
Uma bolha explode em flor

E ainda que fira o espinho
o carinho do perfume
prevalece até o cume
suavizando o caminho
na apaixonante escalada
rumo à Terra Abençoada
onde o sol não vai se pôr

O amor só quer amar
Lançar suas velas ao mar
Percorrer os oceanos
Não importa quantos anos
a viagem vá durar

Se é mais sólido que o ar
será sempre verdadeiro
Elo vital de algo inteiro
como as contas de um colar
as contas de um colar
contas de um colar
de um colar
um colar
colar
lar


sexta-feira, 7 de agosto de 2015

Prazeres da alma

Prazeres excitam mas depois acalmam. Escrever me acalma porque me excita, me dá prazer. Depois me acalma. Mesmo que o poema seja e saia denso, intenso. 

Prazeres têm nuances e matizes. Dias em que não escrevo são incompletos, inconclusos. Continuam sendo dias, mas faltantes de tons.

Pensar me faz escrever, mas escrever me faz pensar. Pode parecer só mais uma imagem poética, mas acontece. A escrita dialoga com o escritor. É mágico. Se não é, ao menos parece.

E eu sigo colhendo pretextos pros meus textos. Tem sido incessante. Que seja enquanto dure.

A escrita me faz mergulhar num estado de espírito singular. Quase um transe, um autismo. E alento.

Escrever é antídoto pra faltas de sentido e elixir que inspira o melhor existir. É o momento em que posso agregar o brinquedo à emoção, a infância à velhice, a leveza de nuvem que traz a fantasia ao sabor acre do real.

Não sei dizer, não atino sobre o que ou quem eu seria se não escrevesse. Talvez eu nunca tivesse existido. Ou virado uma pedra muda e quieta.




sábado, 1 de agosto de 2015

Preto e branco em cores 3


Noel Rosa e Chico Buarque, não por acaso, dois entre talvez três ou quatro dos maiores compositores brasileiros, são sambistas. E brancos. O grande Adoniran Barbosa também. 

O samba, é claro, em sua essência é negro. Cartola, Nelson Cavaquinho, Pixinguinha, Monsueto, Ismael Silva que o digam. Mas os sambas de Noel e Chico não deixam nada a dever ao dos mestres negros.

Eminem, aquele rapper branco caucasiano americano é o “gringo no samba” lá deles, os rappers negros, que têm a coisa nas veias, impressa no DNA. Mas o branco faz o rap dele bem direitinho e não é discriminado.

E eu sou uma espécie de candidato a “Eminices” por enquanto eventuais. Escrevi um conto em prosa poética, chamado “O passageiro – uma rap-sódia carioca”, que traz em sua narrativa uma sonoridade e ritmo evocando os raps e este poema, o Rap de Arac.

Rappers, ao seu modo, são os novos repentistas. Minha admiração por eles!

Então tem branco no rap ao sul do Equador. Sejam indulgentes, por favor. Que seja indolor. E que rufe o tambor.